MONTANHAS IBÉRICAS

Neste Blog partilho com os leitores a minha paixão pelas Montanhas Ibéricas, lugares únicos, cada vez mais raros, onde a beleza das paisagens, a preservação dos ecossistemas e a utilização sustentável pelo homem se unem de uma forma harmoniosa e equilibrada.

27 junho 2006

A MAGIA DAS PORTELAS

Publicada por Paulo Almeida Santos

Para os amantes da montanha, os atractivos que esta nos oferece são imensos, diria mesmo, inesgotáveis… Caminhar junto a um curso de água, atravessar um bosque, subir a um cume, percorrer um cordal montanhoso, vasculhar com os binóculos as encostas e os céus em busca de determinada espécie…
Para mim, um dos pontos altos de qualquer caminhada consiste, sem sombra de dúvida, na travessia de uma portela. Aqui ao lado, em Espanha, a estes sítios mágicos dão o nome de collados.
Sendo zonas relativamente elevadas, normalmente entre dois cumes, as vistas que oferecem são invariavelmente espectaculares. Muitas vezes constituem a linha divisória entre dois ecossistemas completamente diferentes, caracterizados por climas distintos aos quais se adaptam múltiplas espécies de comunidades vegetais.
Por último, funcionam como autênticos corredores biológicos para a fauna, sendo cruzados frequentemente por várias espécies silvestres na busca de recursos alimentares, como rota de dispersão ou como lugar privilegiado para depositar um conjunto de sinais que servem de marcação territorial.
Convido-vos, por fim, a uma viagem fotográfica através de várias portelas da orografia Ibérica que tenho cruzado nos últimos anos, sempre na expectativa de saber o que estará do lado de lá!


COLLADO DE LA CANDONA (1263m)
PARQUE NATURAL DE LAS UBIÑAS
19.03.2005


COLLADA LA ENFESTIELLA (1685 m)
PARQUE NATURAL DE SOMIEDO
25.06.2004


COLLADO DE AGUINO (1366 m)
PARQUE NATURAL DE SOMIEDO
16.01.2005


COLLADA LLAGUEÑOS (1430 m)
PARQUE NATURAL DE SOMIEDO
12.06.2005


COLLADA CUALMARCE (1950 m)
PARQUE NATURAL DE SOMIEDO
05.10.2005

COLLADO CHAMAURÉN (1793 m)
ALTO SIL
21.08.2005


COLLADA DE RECONCO (1760 M)
PARQUE NATURAL DE LAS FUENTES DEL NARCEA E IBIAS
30.05.2006


COLLADO DE MONCÓ (918 M)
PARQUE NATURAL DE LAS FUENTES DEL NARCEA E IBIAS
03.12.2005

COLLADO DE PANDEBANO (1212 M)
PARQUE NACIONAL DOS PICOS DA EUROPA
04.10.2004

COLLADO DEL MURO (1636 m)
PARQUE NATURAL DE SOMIEDO
06.10.2005


COLLADO LA PRIDA (1200 m)
PARQUE NACIONAL DOS PICOS DA EUROPA
07.10.2004

COLLADO LA SIECHA (998 m)
PARQUE NATURAL DE LAS FUENTES DEL NARCEA E IBIAS
03.12.2005

GARGANTA DEL JOU SIN TIERRE (2082 m)
PARQUE NACIONAL DOS PICOS DA EUROPA
04.10.2004


COLLADO TIMARRO (1099 m)
PARQUE NACIONAL DOS PICOS DA EUROPA
30.11.2004


COLLADO VALLEJO (1540 m)
PARQUE NACIONAL DOS PICOS DA EUROPA
04.10.2004

LA LLOMBA DE CAMAYOR (1700 m)
PARQUE NATURAL DE SOMIEDO
05.10.2005

05 junho 2006

CAMINHADA PELO TRILHO ENCANTADO

Publicada por Paulo Almeida Santos


Para quem visita o Parque Nacional de Aiguestortes i Estany de Sant Maurici pela primeira vez, a abordagem pelo seu extremo oriental reveste-se de particular interesse, pois é a partir daqui que temos acesso aos recantos mais emblemáticos e particularmente espectaculares deste Espaço Natural.
O ponto de partida localiza-se na pitoresca vila de Espot, onde está sediado um dos excelentes centros interpretativos do parque, lugar ideal para recolher todas as informações importantes para quem deseja percorrer estas montanhas a pé.
A caminhada que vos proponho nas linhas seguintes vai colocar-nos junto ao Lago Monestero, passando pelo Lago de S. Maurício e rodeando os cumes míticos dos Els Encantats, sendo estes dois últimos os verdadeiros ícones do Parque.
A subida apresenta um desnível de pouco mais de 500 m, que são vencidos em cerca de 3 horas.
O início do trilho localiza-se numa zona chamada Prat de Pierró, aos 1650 m (a cerca de 10 Km de Espot). Aqui encontramos uma pequena casa do parque, onde um guarda dá a cada visitante um pequeno prospecto com uma mapa da zona e algumas recomendações a seguir, bem como um saco para a recolha de lixo. Quando é que nós, portugueses, atingiremos este nível de consciência ambiental (perdoem-me o desabafo!) …
O caminho, sempre bem marcado, com alguns sectores construídos sobre uma plataforma de madeira, aprofunda-se num denso bosque de abeto, sombrio, sempre paralelo às águas frias e revoltas do rio Escrita. O observador mais atento pode, com alguma facilidade, surpreender o esquivo Melro de água (Cinclus cinclus) num dos seus mergulhos à procura de alimento!

Ponte sobre o Rio Escrita

Em pouco tempo atingimos uma zona aberta, onde o trilho discorre por entre prados verdejantes, entrando novamente no bosque, agora enriquecido por outras espécies, como o pinheiro-silvestre e a bétula, habitat favorável à presença do raríssimo Galo-montês (Tetrao urogallus).


Extensos bosques de abetos e pinheiros cobrem a superfície do Parque


O próximo ponto de interesse corresponde à capela de S. Maurício, edificada junto a um afloramento rochoso, sendo este um local de devoção para toda a população do Vale de Espot.
Desde este lugar, olhado para sul, podemos contemplar uma das vertentes dos míticos picos Els Encantats, os quais serão presença constante ao longo do trilho restante.


Os cumes dos Els Encantats são presença constante ao longo da caminhada


Em 10 min atingimos o emblemático Lago de S. Maurício (1910 m), cujas águas calmas, rodeadas de bosques impenetráveis e protegidas por uma autêntica muralha de montanhas, representam na perfeição a herança deixada neste maciço pelas várias glaciações do passado.


Lago de S. Maurício


O próximo objectivo será a aproximação ao vale do rio Monestero, que se abre em direcção sul a partir do Lago de S. Maurício. Para tal, teremos que passar junto ao Refúgio Ernest Mallafré, altura em que a pista de terra batida se transforma num trilho estreito, iniciando-se neste ponto a subida do vale, sempre pela margem esquerda do rio.
É neste local que o visitante pode contemplar, em todo o seu esplendor, a indescritível imagem dos Els Encantats, o Grande (2746 m) e o Pequeno (2725 m), verdadeiras pirâmides-gémeas, que escondem na sua “intimidade” interessantes lendas e fábulas, guardadas pelos muitos grupos de camurças (Rupicabra rupicabra) que povoam as suas escarpas!


Els Encantats em todo o seu esplendor


Aos 2000 m, os abetos vão sendo substituídos progressivamente por bosques tipicamente pirenaicos de pinheiro-negro, mais adaptados aos rigores do clima que se verificam a esta altitude.


O pinheiro-negro inicia a sua aparição a grande altitude


Dominando lá no alto esta paisagem abrupta, a silhueta do inconfundível e majestoso Quebra-ossos (Gypaetus barbatus), o maior dos abutres, com cerca de 3 m de envergadura, deixa-nos verdadeiramente arrepiados e, ao mesmo tempo, agradecidos por tão rara observação!


A silhueta inconfundível do Quebra-ossos


Mais acima, numa zona chamada Fangassals de Monestero, em tempos uma língua glaciar, podemos contemplar outro fenómeno singular destas paragens –as Aiguestortes. Trata-se de uma zona plana onde o rio serpenteia por entre a vegetação, dividindo-se numa rede labiríntica de meandros, permitindo o crescimento de interessantes comunidades de plantas adaptadas a este ambiente aquático.


Aiguestortes


Passamos, em seguida, à travessia de uma zona de prados alpinos, ao som dos incessantes guinchos de alarme das marmotas (Marmota marmota), as quais, após um longo período de hibernação, juntamente com as crias recém-nascidas, buscam activamente alimento ao longo do dia.


O olhar vigilante da marmota


Chegamos, finalmente, ao nosso destino final, a cerca de 2150 m de altitude! À nossa frente, as águas calmas azul-turquesa do lago Monestero revelam um dos lugares mais fascinantes que alguma vez pude contemplar! Todo o cenário aparece espelhado nas suas águas… Parece irreal… Olhando para cima, apercebemo-nos que, de facto, tudo aquilo existe! Por entre os prados verdejantes e o caos de blocos rochosos, erguem-se pequenas manchas de pinheiro-negro, autenticamente engolidas por um circo glaciar intransponível, coroado pelo gigante Pico de Peguera (2942 m), ponto culminante desta zona.


Lago Monestero. Ao fundo, o Pico de Peguera (2942 m)


Chegou a altura de abandonar este cenário idílico… A descida até ao ponto de partida demora-nos cerca de 2 horas, iluminados, agora, pela luz ténue deste magnífico fim de tarde estival…