MONTANHAS IBÉRICAS

Neste Blog partilho com os leitores a minha paixão pelas Montanhas Ibéricas, lugares únicos, cada vez mais raros, onde a beleza das paisagens, a preservação dos ecossistemas e a utilização sustentável pelo homem se unem de uma forma harmoniosa e equilibrada.

10 outubro 2008

RUTA DEL ALBA - A MAGIA DA ÁGUA

Publicada por Paulo Almeida Santos




Mergulhada nas profundezas do concelho asturiano de Sobrescobio e integrada no Parque Natural de Redes, encontramos a fantástica Ruta del Alba, um trilho que discorre no coração de um dos acidentes geográficos mais impressionantes da Península Ibérica. Trata-se de um caminho largo, em terra batida, acessível a qualquer tipo de caminheiros, que se realiza em cerca de 5 horas, após um desnível acumulado de 300 m e numa extensão de 14 Km. Durante praticamente todo o percurso, o trilho serpenteia paralelo às águas revoltas do rio Alba, as quais escavam um apertado canhão rodeado por imponentes escarpas, que impedem a passagem dos raios solares durante grande parte do ano.

O início do trilho tem lugar na pitoresca aldeia de Sotu de Agues, onde para além da típica arquitectura asturiana, podemos apreciar um belo conjunto de hórreos em bom estado conservação.




Perspectivas da aldeia de Sotu de Agues onde tem início a caminhada


Encontramos com facilidade o nosso trilho, o qual só permite trânsito motorizado para veículos agrários locais. O primeiro sector do percurso serpenteia por entre prados verdejantes pertencentes à comunidade local, à medida que nos aproximamos da entrada do canhão.

Perspectiva da entrada do desfiladeiro do rio Alba

Entramos definitivamente no esperado desfiladeiro, em cujas vertentes calcáreas crescem espécias arbóreas típicas da zona, particularmente a faia (Fagus sylvatica), o carvalho (Quercus robur) e o teixo (Taxus baccata). No fundo do vale pontificam várias espécies arbóreas ribeirinhas, rodeando as margens banhadas pelas águas cristalinas do rio Alba, que neste sector correm de forma tranquila e melodiosa.





Imagens do tramo mais a jusante do desfiladeiro


Deixamos para trás as ruinas de uma antiga exploração mineira de ferro (Campurru), altura em que o vale volta novamente a abrir, permitindo a existência de férteis pastagens, aqui e ali salpicadas por pequenas cabanas que servem de abrigo a pastores e respectivos rebanhos, quando as agruras do clima obrigam ao recolhimento.

Conjunto de cabanas no fundo do vale


Durante todo o percurso o caminheiro é brindado com diversos paineis informativos que descrevem ao pormenor as características mais peculiares do ecossistema envolvente, dando particular relevância às aves rupículas como a águia-real (Aquila chrysaetos), o grifo (Gyps fulvus) ou o abutre-do-egipto (Neophron percnopterus), sem esquecer a riquíssima comunidade de mamíferos que ocupam as escarpas, as massas boscosas e o meio aquático, onde se destacam, respectivamente, a camurça (Rupicapra rupicapra), o corço(Capreolos capreolos) e a lontra (Lutra lutra).

Exemplo de um painel informativo que se pode apreciar durante o percurso


Atingimos uma zona de encruzilhada de trilhos-Pontón de Retortunio-, altura em que o estradão se converte num trilho mais estreito. A partir daqui o vale volta a fechar-se, sob paredes cada vez mais verticais e sombrias–entramos definitivamente no coração do desfiladeiro!Necessitamos de cerca de uma hora para percorrer esta maravilha da natureza. Por muitas vezes o caminho aparece escavado no interior da escarpa formando túneis, esculpido durante anos e anos pelos homens da terra, em busca de uma passagem para os prados de altitude e para os suaves planaltos da meseta leonesa. É aqui que as águas do rio Alba mostram a sua fúria, precipitando-se em dezenas de cascatas, rápidos e remoinhos, emitindo uma forte sonoridade só abafada pela espessura dos distantes faiais. Este espectáculo pode ser apreciado bem de perto numa das três pequenas pontes que cruzam o curso de água.






Magníficas cascatas e paredes verticais dominam o coração do desfiladeiro


Subitamente surge o silêncio... O rio Alba transforma-se num pequeno regato que drena as águas cristalinas do bosque de Llaímo, um extenso faial que se estende pela base dos cumes de La Forcada e El Retrinon. Estamos num local chamado Cruz de los Rios onde podemos encontrar uma pequena cabana aberta nos meses de verão e que assinala o final da nossa caminhada.

Cruz de los Rios, na base do bosque de Llaímo

Resta-nos descer pelo mesmo trilho até à pacata aldeia de Sotu de Agues. Depois de deixar o desfiladeiro e já muito próximo da aldeia, surge um desvio à direita que atravessa um extenso souto, permitindo ao caminheiro saborear as deliciosas castanhas asturianas enquanto se aproxima do final do passeio – um autêntico aperitivo para esta época outonal!

16 julho 2008

URSO-PARDO CANTÁBRICO SEGUE EM FRANCA RECUPERAÇÃO NO NORTE DA PENÍNSULA

Publicada por Paulo Almeida Santos



O censo das fêmeas de urso-pardo cantábrico (ursus arctos) com crias do ano que decorreu durante a passada primavera nos principais maciços montanhosos do norte de Espanha, continuou a revelar a tendência de crescimento desta espécie emblemática, a qual se tem verificado nos últimos anos. Os números foram revelados recentemente pelo Director Geral da Biodiversidade do Governo Asturiano, apoiado por diversas ONG´s idóneas, que acompanham passo-a-passo os plantígrados no seu habitat natural e que têm implementado um grande número de projectos de conservação para a espécie. As estimativas avançadas indicam que o número de ursas com crias triplicou entre 1989 e 2007, o que confere um "optimismo moderado" para a conservação da espécie. Os dados avançados falam de 21 progenitoras com 39 crias, batendo todos os recordes desde os primeiros censos que tiveram lugar no início da década de 80.
Os resultados foram particularmente impressionantes para a denominada "população ocidental", com 18 ursas e 34 crias. Relembro que a população ursina da Cordilheira Cantábrica se encontra fragmentada desde há várias décadas pelo chamado corredor de Huerna, onde existe uma grande infra-estrutura viária que liga as Astúrias à Meseta. Até agora e apesar dos esforços, ainda não foi possível de forma eficaz unir as duas populações, sendo que a "população oriental", muito mais pequena e, portanto, mais sujeita aos efeitos da consanguinidade, corre sérios riscos de desaparecer a curto prazo se não houver intercâmbio genético entre as mesmas.


De qualquer forma, existem indícios objectivos que comprovam o alargamento progressivo da área de distribuição do urso. A oriente têm surgido nas últimas semanas vários relatos de observações de indivíduos em vales previamente não ocupados, nas províncias de Palência e na Cantábria. A norte foram fotografados a somente 10 km´s de Oviedo e junto à costa. A sul, surgem cada vez mais avistamentos nas montanhas próximas à cidade de Ponferrada e nos Ancares galegos, a menos de 100 km´s em linha recta do norte de Portugal...

As vertentes declivosas e fortemente arborizadas do Espaço Natural do Alto Sil albergam um dos mais importantes núcleos ursinos do Norte de Espanha

Apesar do moderado optimismo, importa realçar que o urso-pardo cantábrico ainda possui um estatuto de "perigo de extinção", pelo que o empenho das autoridades não deve esmorecer, de forma a restabelecer a estabilidade populacional deste super-predador tão singular da nossa fauna ibérica.

Vídeo mostrando as emblemáticas Paca e Tola que vivem em regime de semi-liberdade na localidade de Proaza (Vale de Trubia)

28 junho 2008

PNPG INTEGRA A REDE PAN PARKS

Publicada por Paulo Almeida Santos

“Rushing wild rivers, ancient forests, towering mountains; in Europe there is a jungle, indeed there are many. Bears, wolves, eagles and bison live in these jungles, Europe's national parks. And yet, most Europeans are unaware of all but a few well-known forests and mountain ranges. The lack of awareness is reflected in a lack of investment, institutional resources, and pride for these jewels of nature.”


As primeiras linhas do site da PAN (Protected Area Network) Parks chamam de imediato à atenção do visitante para o valor e a seriedade deste importante projecto, desenvolvido pela WWF em 1997 no âmbito da sua actuação a nível europeu.
Conservação da Natureza e Desenvolvimento Sustentável, desde o Ártico ao Mediterrâneo, são os valores essenciais que imperam nesta iniciativa.


Parque Nacional de Bieszczady na Polónia, pertencente à rede PAN Parks desde 2002


À rede actual composta por 10 Áreas Protegidas distribuídas pelo continente europeu, vem juntar-se desde Junho de 2008 o “nosso” Parque Nacional da Peneda Gerês (PNPG), o que muito nos deve orgulhar, sendo o único representante ibérico neste grupo de excelência.
Este reconhecimento não deve, contudo, negligenciar o muito trabalho que ainda tem de ser levado a cabo pelos responsáveis do PNPG em áreas tão críticas como o combate aos incêndios, reflorestação, vigilância do meio e conservação das espécies, bem como à criação de mecanismos que permitam fixar e incentivar as populações do Parque. O incêndio do Ramiscal, a expansão das acácias no vale do Gerês ou a pré-extinção da águia-real, são exemplos recentes de atentados ambientais que têm de ser rapidamente resolvidos, de forma a preservar um dos raros ecossistemas de montanha que nos resta, já que tudo o resto foi ou será dizimado…

Paisagem típica do PNPG, o mais recente membro da rede PAN Parks

21 outubro 2007

MONTESINHO INDEFESO...

Publicada por Paulo Almeida Santos



Depois de definitivamente consumada a decisão que autoriza a construção da Barragem do Sabor, o assalto ao património natural do Nordeste Transmontano continua a não dar tréguas, agora que a viabilização do maior parque eólico europeu na área do Parque Natural de Montesinho (PNM) ganha cada vez mais corpo.
As minhas desconfianças explanadas há meses neste espaço confirmaram-se na íntegra. Uma empresa que surge com um mega-parque eólico para o PNM, prometendo "mundos e fundos" às carenciadas populações locais. O poder autárquico local que, em massa, falou do projecto como se de algo inevitável se tratasse. Tudo isto acontecia numa altura em que os passos finais da elaboração do plano de ordenamento do PNM estavam a ser dados e em que o parecer técnico era claramente desfavorável à exploração eólica do parque. Chegou a fase de discussão pública e, como se esperava, o apoio político ao projecto foi esmagador, nomeadamente pela figura do Sr. Ministro do Ambiente. Após concluída a fase de discussão pública, falta a decisão final que irá ser tomada brevemente em Conselho de Ministros. Só os anjinhos acreditam que o empreendimento não vai avançar... E o PNM vai mudar definitivamente de rosto, graças ao excelente contributo de meia dúzia de engravatados que não têm a mínima sensibilidade e conhecimento para avaliar a destruição que vão provocar...
No meio de tantas notícias sobre este tema ao longo dos últimos meses, gostaria de referir duas, uma pela positiva e outra pela negativa.
Em primeiro lugar, elogiar a frontalidade e a coerência do ICNB que, por intermédio de Henrique Pereira dos Santos, demonstrou a incompatibilidade deste projecto com a preservação dos valores naturais destas montanhas.
Em sentido contrário, a posição da Quercus sobre este tema deixou-me profundamente indignado e revoltado! Então estes senhores, representantes da ONG ligada ao ambiente com maior projecção nacional, vêm defender a colocação de eólicos dentro do PNM??? Ontem contra a Barragem do Sabor, hoje a favor de eólicos em áreas protegidas? Quais são os critérios? Terá sido um parecer precipitado, individualizado, ou, pelo contrário, mais um passo no sentido da governamentalização e mediatização desta instituição? Interesses escondidos...? Talvez... Já acredito em tudo... Fazendo uma pesquisa no sítio da Quercus na Internet com a palavra-chave "Montesinho", esta apenas aparece em 5 ocorrências, a última de 2005! Já da palavra "aeroporto" resultam 30 mensagens... Sintomático, não? Não me lembro do movimento conservacionaista nacional ter batido tão fundo... Mais valia estarem calados...
A mensagem final que gostaria de deixar é esta: de cedência em cedência, de mini-parques eólicos a grandes empreendimentos, o que é certo é que as nossas serras estão a ser polvilhadas por ventoinhas que, para além de provocarem a artificialização das paisagens, outrora naturais e selvagens, condicionam impactos claros nas comunidades locais de plantas e mamíferos, levando ainda ao incremento da desertificação do interior, ao contrário do que muitos advogam.
Termino com a exposição de um mapa da região Norte de Portugal, onde tentei colocar os empreendimento eólicos concluídos, juntamente com os novos projectos para o concelho de Bragança. O cenário é desolador... Sobra o Parque Nacional da Peneda-Gerês, cada vez mais sufocado pelo cerco dos aerogeradores... Será o próximo, não tenho dúvidas...

As nossas serras estão a saque...

24 julho 2007

UM OLHAR SOBRE O MAIS PEQUENO CARNÍVORO DA NOSSA FAUNA

Publicada por Paulo Almeida Santos

Pertencente à família Mustelidae que inclui, entre outros, a lontra (Lutra lutra), a marta (Martes martes) e o texugo (Meles meles), a doninha (Mustela nivalis) representa o elemento mais pequeno deste grupo de mamíferos, sendo considerada o carnívoro de porte mais pequeno da nossa fauna.

Dados biométricos da doninha (Mustela nivalis)

Apesar dos machos atingirem dimensões discretamente maiores que as fêmeas, podendo medir cerca de 27cm e pesar até 170 gr, o dimorfismo sexual não existe relativamente às outras características físicas. A pelagem curta é castanha arruivada no dorso, cabeça, patas e cauda, sendo o ventre completamente branco.


A pelagem acastanhada do dorso contrasta nitidamente com a mancha ventral clara, característica comum a outros mustelídeos.


Relativamente à sua identificação, a diferenciação entre a doninha e o arminho (Mustela erminea), outro mustelídeo da nossa fauna, pode levar a alguma confusão no período do ano em que este adquire a pelagem de Verão, já que no Inverno se apresenta maioritariamente branco. O raríssimo arminho diferencia-se essencialmente por um porte ligeiramente maior e, principalmente, por apresentar uma cauda mais comprida e negra na extremidade.

Arminho (Mustela erminea)

No que diz respeito à distribuição, a doninha é, juntamente com o toirão (Mustela putorius), o mustelídeo que apresenta uma abrangência mais ampla em termos de ecossistemas, ocupando desde zonas florestadas de montanha até áreas humanizadas, caracterizadas por pastos e campos de cultivo divididos por muros de pedra, o que lhes confere simultaneamente área de caça e refúgio.

A abundância de muros de pedra é uma característica importante no habitat da doninha.


O território de cada macho engloba o de várias fêmeas apresentando ambos, no entanto, hábitos eminentemente solitários e territoriais, só quebrados na altura do cio.
O seu período de actividade distribui-se ao longo do dia e da noite, interrompido por alguns momentos de descanso.
Trata-se de um animal dotado de extrema agilidade e, ao mesmo tempo, voracidade, o que lhe permite predar sobre mamíferos com tamanhos consideráveis comparativamente ao seu, como por exemplo coelhos! No entanto, roedores e pequenas aves constituem a sua principal fonte de dieta.

Na actualidade trata-se de uma espécie não ameaçada, que pode ser vista com alguma facilidade ao longo do dia junto a áreas humanizadas. As fotos apresentadas representam um exemplar adulto observado a meio da tarde, durante largos minutos, num amplo prado situado no Vale do rio Minho.